quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Um texto antigo reescrito

Eu tenho a impressão que já postei este artigo que escrevi abaixo. No entanto como eu fiz alguns acréscimos e retoques achei que valia a pena publicar novamente. A festa de hoje é tão especial, tão cara para quem é consagrado e quer erguer com a própria vida o Menino Jesus para que muitos conheçam o Seu Amor e a Paz que somente Ele pode dar, que a gente nunca se cansa de falar dela e do que ela representa... Que Nossa Senhora e S.José nos ajudem nesse caminho maravilhoso de esperança e de amizade com Jesus nos átrios da vida.

OS JOVENS ANA E SIMEÃO

Não creio que encontremos no Brasil um jovem que se chame Simeão, ou mesmo alguém que de este nome a um filho pois este personagem bíblico, citado somente em S.Lucas, por tratar da infância de Jesus, era um ancião. Simão até vai, por causa de S.Pedro, mas Simeão tem jeito de nome antigo, fora de moda. Ana teve mais sorte, não ficou com a mesma fama e continua sendo um nome belíssimo e muito popular em todas as culturas e idiomas. Esta Ana do capítulo 2 de S.Lucas era uma senhora bastante idosa e seus 84 anos testemunham uma rara longevidade, principalmente tratando-se da Antiguidade.

Mas quem foram estes dois discretos personagens, anciãos, servos bons e fiéis, que em Jerusalém, no Templo, quem sabe amigos de longa data, tem nos braços o Menino Jesus? O que podemos com eles aprender, além do evidente louvor fruto de vida de oração, e da fé nas promessas do Senhor, em suas palavras? Quem são esses dois que abordam José e Maria nos átrios do templo e reconhecem na criança recém-nascida o Messias que havia de vir?

Antes, porém, de partilharmos os frutos da meditação feita sobre este texto, falemos sobre as informações bíblicas contidas neste encontro da Sagrada Família com estes dois anciãos que podem enriquecer a todos e que mostram o encontro da Antiga e da Nova Aliança. Somente aqui em Israel fiquei sabendo que se hoje dia 2 de fevereiro celebramos a apresentação de Jesus no Templo de Jerusalém, amanhã, dia 3 de fevereiro, será a festa de Sta.Ana e de S.Simeão, festa importante no mundo cristão do Oriente.

No dia 2 de fevereiro completa-se exatamente 40 dias após o Natal e a Igreja celebra a primeira entrada de Jesus no Templo (cf. Lucas 2:22-40). No Evangelho, está escrito que seus pais, observantes da Lei Mosaica vão ao Templo no fim do tempo de purificação de Maria (40 dias após o nascimento de um filho de acordo com a Lei de Moisés, como está escrito em Levítico 12:2-8) . São Lucas também faz referência às leis sobre a redenção do primogênito (mencionado no Êxodo 13). De acordo com a Lei, a mulher é chamada a levar 'um cordeiro de um ano para o holocausto, e um pombo ou uma rola para oferta pela expiação dos pecados' (Levítico 12:6). O fato de que a família de Jesus trouxe 'duas rolas ou dois pombinhos' é um sinal claro de que a família era pobre. A Lei de Moisés afirma explicitamente: 'Se ela não pode pagar uma ovelha, ela tomará duas rolas ou dois pombinhos, um para o holocausto e outro para a expiação do pecado, e o sacerdote fará expiação em seu nome, e ela estará purificada'. (Levítico 12:8). Lucas combina a observância do mandamento de Levítico com o preceito relativo à redenção do primogênito em Êxodo 13:2 e 13:11-16.

Jesus é como nós em tudo, e assim ele também deve ser resgatado exatamente como ele foi circuncidado ao oitavo dia (cf. Lucas 2:21). A festa da apresentação de Jesus no Templo passou a ser celebrada no IV século e era chamada a 'Festa do Encontro': o encontro entre Jesus e Simeão e Ana, que representam todo o povo de Israel, a antiga Aliança.

Interessante encontrar os fundamentos bíblicos da celebração litúrgica católica e pensar em todos os que nos precederam celebrando esta mesma festa.

Mas voltando aos nossos personagens Simeão e Ana, quem nos falou a respeito deles em 2009 em Nazaré, exatamente nesta mesma data, quando estava em peregrinação na Terra Santa, foi o biblista Gregorio Vivaldelli, grande amigo e irmão da Comunidade Shalom, italiano de Riva del Garda. Como nesta data se comemora a vida consagrada de homens e de mulheres, religiosos e leigos, ele aproveitou para fazer uma meditação exatamente sobre estes dois santos idosos com aqueles que puderam comparecer. O que escrevo a seguir é uma pálida síntese de minhas anotações e um pálido reflexo do que aprendemos naquele dia. Só sei que foi tão simples e tão ungido que espero continue alcançando a quem porventura ler este artigo.

Ana em sua velhice representa todos os estados de vida servindo o Senhor, em oração, à espera do Senhor que vem, nos ensinou o Gregório. Ela representa todas as faixas etárias e estados civis, acrescento eu, pois o evangelista faz questão de dizer que ela era viúva. E quantas milhares de mulheres viúvas, separadas, divorciadas reconstroem a própria vida 'nos átrios do templo', na vida comunitária, paroquial, nos apostolados, etc?

Ana nos ensina o valor de encontrar Jesus, nas realidades ordinárias da missão cotidiana de nossas vidas. Reconhecer Jesus onde Ele está e onde Ele se esconde. Se Ana não tivesse esta sensibilidade espiritual dada pelo Espírito Santo e pelo contato com os profetas, a Palavra de Deus, não reconheceria o Menino no braço de sua Mãe, pois Maria e José eram um casal igual a todos os outros que passavam pelo templo em meio à multidão e quem já teve a alegria de ir à Jerusalém sabe como aquele espaço é imenso. Mas Ana reconheceu Jesus e o teve em seus braços, diante de seus olhos. Deve tê-lo abraçado e dado 'um cheiro' contemplando-o com toda ternura e emoção.

Já Simeão além de erguer a voz em ação de graças, testemunhando publicamente sua fé e amor pelo Senhor, nos aponta um outro caminho surpreendente: o da esperança e da confiança nas novas gerações! Nos disse o Gregorio que 'o Evangelho nos transmite toda a comovente confiança de um homem ancião no pequeno Jesus. Essa imagem que nos é apresentada na festa da Apresentação do Senhor é verdadeiramente bela, mais ainda se considerarmos com que facilidade ao longo da História adultos e anciãos consideraram os jovens como motivo de lamentação'. E para ilustrar, nosso amigo biblista nos surpreendeu com algumas citações que pareciam ter sido colhidas das conversas que circulam nas escolas, nas ruas, nas famílias e em quase todos os ambientes e publicações:

"A juventude agora um triste lixo. Não tem mais uma gota de bom humor e não fazem outra coisa que protestar" (Walter von Vogelweide, 1200 dC)

"Nossa juventude vive na abundância, no luxo. Mal educada, despreza toda autoridade e não demonstra nenhum respeito pelos mais velhos. Nossos filhos são verdadeiros egoistas que frequentemente se rebelam contra contra os pais" (Sócrates, 420-395 aC)

"Não há mais nenhuma esperança para o futuro do nosso país quando a 'desmiolada' juventude de hoje tiver o poder em mãos no amanhã. Esta juventude é indomável, sem freio e presunçosa" (Esíodo, 720 aC)

"O nosso mundo chegou a uma situação crítica. Os filhos escarnecem seus pais, são insubordinados é só querem se divertir" (hieróglico de 2000 aC)

"A nossa juventude está corrompida até a medula e é muito pior que as gerações passadas, esta juventude não terá condições de salvar nossa cultura" (escrito cuneiforme de 3000 aC).

Quem chegou até aqui deve ter se sentido tão apanhado, rindo meio sem graça, como aconteceu com a assembléia de consagrados em Nazaré naquela noite memorável. Fazemos hoje a mesma coisa que faziam ou fazem os pagãos! Os santos como S.João Bosco e o amadíssimo Beato João Paulo II nunca temeram a juventude e depositaram sobre ela toda a sua esperança, vendo-a com os olhos de grande amor, vendo nos jovens o potencial a ser desabrochado e formado.

O mesmo podermos dizer de nosso também amado e respeitado fundador, Moysés Azevedo, que sendo jovem ofertou sua juventude aos pés do Papa João Paulo II para evangelizar outros jovens levando-os a conhecer Jesus Cristo, o Shalom do Pai, o Ressuscitado que passou Cruz, a única fonte da verdadeira alegria, paz e sentido de vida. Em suas próprias palavras, na Carta escrita à Comunidade na Páscoa de 2005 ele vai dizer que os jovens são 'A alegria de Deus e minha alegria'.

Que Ana e Simeão intercedam por nós. Ao colocarem o Menino nos braços e louvarem a Deus eles nos ensinam a colocar Nele a confiança, guardando um olhar posiitvo sobre a realidade, pois Deus se fez criança. Há esperança para o futuro exatamente por causa dos jovens. 'Não se trata de nos tornarmos pessoas iludidas e incapzes de reconhecer o drama que cerca a vida de milhões de jovens, na violência desconcertante, na banalidade viciante da internet ou no vazio dos ídolos escolhidos como modelo da existência', finalizava Vivaldelli, mas Jesus e Maria ao apresentarem o Menino no Templo nos apresentam a novidade que está presente em cada nova vida, criança e jovem.

Um ancião e uma anciã abraçam um bebê mas naquele Menino abraçam o futuro, o próprio futuro. A esperança é pequena como é pequena cada criança porém plena de vitalidade e de potência. Simeão e Ana se alegram porque alguém vem depois deles e continuará a obra que eles começaram e se alegram com a própria decadência que dá espaço ao novo, ao que vem a seguir. E isso não é fácil, deixar que o velho que há em nós acolha o Menino, ou o menino, ou seja, tudo aquilo que é novo e que Deus nos apresenta, muitas vezes de maneira imprevisível... Mas este é o nosso convite hoje: renovar nossa oferta de vida, dar graças erguendo os braços e a alma, dando espaço para que a esperança nos inebrie e nos leve à frente em nossa missão onde estivermos. Jesus que é Ele mesmo o Templo do Altíssimo vem ao nosso encontro nos átrios da vida e se coloca em nossos braços.

Um comentário:

Anônimo disse...

Querida Ena,
bonito o seu artigo. Se me permite, faço uma pequena correção quanto ao autor de uma de suas citações: o nome é Hesíodo e não Esíodo, como você colocou.
Bjs e Shalom!
Berê