terça-feira, 12 de agosto de 2008

Mais relatos, alguns costumes melquitas

Desde a primeira missa que participei na nossa paróquia melquita aqui em Isefiya (só há uma outra igreja católica na vila e é do rito maronita), passei a beber e aprender com as diferenças, me enriquecendo com o culto e fazendo comunhão. Não é fácil. Este lance de pertença à uma comunidade e reconhecimento dos símbolos que guardam o mistério das 'coisas do Alto', passam pela cultura e a cultura daqui é outra muito diversa da nossa, européia latino-americana. Graças ao bom Deus, à catolicidade da fé e à experiência vivida no Espírito em comunhão com toda a Igreja, e não somente nos elementos da razão, mas também com ela, permanece garantida a presença sacramental de Jesus em todas as suas manifestações: seja no sacerdote celebrante, na assembléia de batizados reunidos ao redor do altar do sacrifício da Nova Aliança, seja na Palavra do Senhor e na sua presença real no Pão e no Vinho consagrados.
Alguns novos jeitos próprios do rito melquita e mesmo algumas tradições, me têm alargado a fé e me impelido a uma atitude de abertura perante Deus e as pessoas, que me rejuvenesce.
Relato hoje duas. A primeira é conviver com um padre casado, pai de três filhos que consagra o Corpo do Senhor e prega sua Palavra distribuindo ambos a toda a assembléia inclusive a sua mulher, sogra, pais... Não nos esqueçamos que a estrutura da cultura oriental e muito acentuadamente a cultura árabe é predominantemente familiar, e aí se inclui tanto cristãos quanto muçulmanos. Continuo achando que essa realidade de sacerdotes casados só funciona mesmo para uma comunidade pequena como a daqui da Palestina ou em outras regiões menores com poucas ovelhas. A Igreja Católica de rito romano é sábia em oferecer aos seus sacerdortes o dom do celibato consagrado, mas este é outro assunto. A novidade, porém, de conhecer um sacerdote casado e saber quem é a 'mulher do padre' sem que isso seja um xingamento como era quando eu era criança, eu já sabia que existia nas Igrejas do Oriente, Melquita, Bizantina e Ortodoxa, mas nunca havia convivido e contemplado a sua beleza.
Uma outra tradição melquita muito tocante diz respeito à Palavra de Deus. Na missa católica melquita só há leituras do Novo Testamento, ou seja um trecho de uma epístola e um texto do Evangelho. Na homilia e nos ícones dispostos no interior da igreja se fala do Antigo Testamento, dos profetas - muito especialmente do profeta Elias ou santo (mar) Elias como é cultuado no Oriente - mas leitura de texto não há. Se salmodia durante vários momentos da celebração, mas Palavra de Deus proclamada na celebração eucarística é só Novo Testamento.
E mais. Na hora que o sacerdote se aproxima do ambão para ler o Evangelho as pessoas que querem testemunhar publicamente uma graça alcançada, em sinal de gratidão, se levantam e se aproximam do sacerdote e de cabeça baixa ouvem a Palavra de Deus. É tão lindo! Às vezes vai uma família inteira, outras só uma senhora com jeito de vó, um homem, pai ou um jovem. Emocionante e silencioso: diante desta Palavra, que é o próprio Jesus, eu venho agradecer o que Ele fez em minha vida.
Esta manifestação pública de gratidão perante a Palavra de Deus tem me feito pensar o quanto eu preciso crescer na leitura orante, longa da Palavra de Deus. Gastar tempo. Trocar a televisão e o computador para saborear os textos... Crescer em curiosidade, em estudo longo, sistemático e contínuo dela, como sinal do meu amor ao Senhor. Crescer no desejo de que minha mente e mentalidade sejam cristianizados pelas palavras, sentimentos, jeito de viver e pensar o mundo e as pessoas que Jesus tem. Como é fácil ficar parada e até prostrada, diante das incontáveis palavras de homens e mulheres, muitas vezes ótimas sem dúvida, mas nenhuma delas com peso de vida eterna como a Palavra de Deus...

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