segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Nova Escola em Haifa

O Arcebispo Elias Chacour, acabou de inaugurar a Escola de Santo Elias filial de Haifa do complexo educacional M.E.E.I (Mar Elias Educational Institutions), que fica em Ibillin, vila do extremo norte da Galiléia. São 110 alunos distribuidos entre as 7a, 8a e 9a série, de maioria cristã mas com presença muçulmana entre os jovens também. Tive certeza disso ao ver as mães de véu, com a cabeça coberta, como é o jeito das mulheres muçulmanas se apresentarem publicamente, na breve cerimônia de inauguração da escola, da qual acabei de chegar com alguns outros funcionários da Cúria que acompanharam o bispo, para prestigiar.


Ele, sem dúvida, é um desbravador, que aceitou o desafio e o convite feito pelo prefeito de Haifa para abrir mais uma escola cristã na cidade para ajudar na formação das novas gerações, cada vez mais perdida nas drogas, na falta de valores existenciais e sem sentido de vida. E aqui e em todo o mundo, o mesmo script e roteiro do filme é rodado. Mudam talvez os cenários e o idioma mas a juventude continua sendo impelida à agressividade pela falta de referências humanas verdadeiras que lhes ensine a transcender e dar a vida por grandes e verdadeiros ideais e não a ideologias que provaram dar com os burros n'água.


A educação e os professores sempre tiveram e puderam exercer grande influência na vida de todos nós, pois quem não foi aluno um dia? E a Igreja é mestra neste campo há centenas de anos. Com crises ou sem crises, pois grandes lideranças e intelectuais do último século que perderam a fé e se tornaram ateus tendo estudado em colégios católicos, de padres jesuítas, por exemplo, a educação sempre foi um campo privilegiado de semeadura da Igreja não somente da fé e da catequese mas dos valores mais verdadeiramente humanos e de respeito à vida que somente o Catolicismo ensina.


E aqui também o bispo Elias Chacour crê e aposta que alguma esperança para a solução do conflito entre árabes e judeus, acirrado depois da criação do Estado de Israel e do movimento sionista, esteja na convivência pacífica e fraterna entre diferentes comunidades religiosas que se sentam lado a lado, na infância e juventude para aprender matemática, geografia, ou fazer parte do mesmo time nas disputas inter-escolares de futebol e outros esportes, e que aprende a guardar e a respeitar os feriados religiosos uns dos outros.


Bispos como este têm ação profética e escrevo no plural porque me lembro de D.Adélio Tomasin, bispo emérito de Quixadá, no Ceará, que tem feito uma silenciosa - nem tanto assim! - revolução no sertão central do estado através da educação, após ouvir, acolher e responder ao apelo feito pelo Papa João Paulo II quando da sua segunda visita ao Brasil. O quanto estas pessoas, jovens e adultos, funcionários e professores da Faculdade Católica Rainha do Sertão são evangelizadas, formadas na fé, catequizadas e verdadeiramente conhecem Jesus Cristo como Deus e Senhor, é um grande mistério que cabe a Deus somente, Ele que é o Agricultor, a julgar e medir. Mas que o Reino de Deus tem se espalhado não há dúvida.


A nós que somos seus servos, cabe dispor o terreno dos corações, cabe interceder e testemunhar e trabalhar com esperança e afinco mesmo consciente de que somos poucos, pequenos e também necessitados, muito necessitados, sem jamais desistir. Graças a Deus existem homens e mulheres neste mundo, alguns consagrados, leigos, celibatários, outros não, que são líderes do quilate destes dois bispos, que não somente remam contra a maré, mas como bússolas sabem apontar para o verdadeiro horizonte.

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

O aniversário

Como último presentinho de aniversário troquei de escova de dente antes de deitar. Isso já era mais de meia-noite depois de um dia cheio de pequenas celebrações pela festa do meu nascimento que começara exatamente na noite anterior, com uma serenata. Este velho costume da Comunidade, de cantar para os irmãos, à noite, na vigília do aniversário, declarando publicamente o quão importante aquela pessoa é para Deus e para quem fala, como também para a casa, é muito singelo mas também valioso. Mesmo que seja repetitivo, pois o jargão é sempre o mesmo e para quem é mais antigo na Comunidade não há mais tanta 'novidade', a riqueza está na pureza do jesto em si, pois o presente não é comprado, não é mercadoria, e resgata o valor da criatividade e do amor pobre que exige humor e doação de si.
Houve cantoria que muito me comoveu por causa dos irmãos e de quem cantava. É claro que estava meio desafinado, o canto, porque as vozes estavam cansadas e o violeiro, meio inseguro na melodia, corria atrás das notas, mas valeu demais. Como diz a Palavra de Deus no apocalipse, quem tem ouvidos para ouvir, ouça! Acho que é assim que nós na comunidade e e em todos os lugares, como cristãos, deveríamos receber e participar das homenagens e celebrações, tantas vezes repetitivos: com os ouvidos novos, os ouvidos do Espírito, ouvindo aquilo que ainda não foi percebido pois Ele é aquele que sabe como ninguém fazer novas todas as coisas, todas as músicas, todas as festas e até o aniversário da gente.


No dia seguinte da serenata, houve um café da manhã com direito a misto-quente e muita conversa fiada. A casa cercada de cartazes que cada irmão e irmã com carinho preparou. Alguns com toques de arte mais evidentes que outros...a Yara arrasa...mas todos generosos em palavras e bênçãos. Uma emoção só, para mim. Na Cúria o ritmo foi corrido e imprevisível como sempre. Almocei com o bispo, Lubna minha amiga e alguns 'abunas' que estavam em casa na hora, também se sentaram à mesa. Ganhei uma blusa azul mimosa e uma bandeija de uvas maravilhosas. Abrimos uma garrafa de vinho branco e recebi bênçãos e parabéns.
De tarde, ao chegar em casa, meu gmail se encheu de mensagens e beijos e declarações de amor. Tanta gente que eu não esperava me escreveu! Outras não puderam, não se lembraram. Poucas pessoas da família escreveram mas da grande família nascida dos laços espirituais, houve agradáveis surpresas. Houve quem me procurou o dia inteiro pelo skype ou msn mas, por causa do fuso horário, não coincidiu estar sentada na internet na hora da chamada. Depois do aniversário vou com calma, conversar com cada um.

Depois missa saimos para comer pizza. Na Eucaristia Jesus me chamou a não ser hipócrita e a comprometer-me com a misericórdia, a justiça e a fidelidade, limpando primeiro o que está dentro para depois me preocupar com a exterioridade. Para a pizza fomos eu, Leo e Cristina, a convite dos padres carmelitas mexicanos que restaram após a partida do Father Bonaventure, os padres Alberto e José (Pepe). Ao sair, voltamos para casa e regados a cafezinho feita com 'mocca' e pó italianos, nos deleitamos com o bolo branco com cobertura de suspiro que a Vivi(ane) fez e que estava delicioso, com jeito de casa e não com gosto artificial de padaria.

Na última fase da festa os irmãos que trabalham em Haifa chegaram do centro de evangelização e houve então mais uma rodada de bolo e mais música e conversa, partilhas. Também tirei umas fotos. Algumas pessoas ligaram e entre elas a Gilda do Méier, que a gente chama de G. I. que me conhece desde menina. Mamãe depois de verdadeira maratona que começara às 7 manhã, me encontrou e matou a saudade. Foi bom repetir para ela a senha de amor que se firmou entre mim e os meus sobrinhos que diz: amo-te! adoro-te! e que gera a resposta na ordem invertida: adoro-te! amo-te!
Dormi com o coração feliz, saudoso e grato, depois de plantar um vasinho que a Lubna me deu. Mesmo com a ausência de tantos que gostaria de ver e abraçar, faço a experiência de encontrá-los fortemente presentes em meu coração. E aos que comigo vivem a experiência comunitária, agradeço toda generosidade e amor. Assim é a vida: um jogo de ausências e presenças. Que bom viver! Bendito seja Deus!
Minha escova de dente é azul.

domingo, 23 de agosto de 2009

O que não é fácil

Não sei bem de onde fiquei com esta impressão, mas pode ser que se pense que a experiência missionária, como a tenho descrita, seja uma sucessão de festas e descobertas espirtuais surpreendentes, onde haja alegria esfuziante, muito estardalhaço e as tensões tenham desaparecido. Não é bem assim.
A imagem mais próxima que posso usar que descreve este tempo da minha vida riquíssimo, sem dúvida, mas extenuante e desafiador, é o deserto. O texto bíblico que ilumina o processo é o de Oséias 2, e posso afirma que esta iluminação não é cultural, exegética somente, mas essecialmente existencial, é palavra que tem sido encarnada em mim pelo Espírito Santo. Estou no deserto para ouvir melhor a voz de Deus no coração. E quem ouve, responde, e para se responder há que se ter voz própria também. Caminhar deserto a dentro é saber que se vai encontrar o silencio e todos os sons que o silencio guarda: as vozes que constroem e as que destroem até restar acima de todas as demais vozes, a voz do Amado, sua presença. Mas este caminho é de peia, em bom dialeto. É luta.
Se no deserto tenho descoberto na noite, a beleza das estrelas, muitas estrelas, a vastidão do céu e por isso a vida é vista com mais amplidão e confiança, no deserto também encontro chacais e alguns bichos que podem devorar, assustar e que precisam ser enfrentados. E assim é a missão: misto de céu e estrelas e misto de sombras e lutas incansáveis, lutas diárias para enfrentar-se e fundamentalmente aprender a amar mais e melhor, começando por amar a si mesmo para amar quem está perto. Mas este aprendizado não é dado em primeiro e segundo tomo, em básico que leva ao nível intermediário. A vida não é assim, e a vida de Deus em nós para nos santificar e amar é menos ainda. O mistério e o Amor do Senhor, sua Presença estão conosco integrais e totais o tempo todo, como o Sol, nós é que não o conhecemos ou podemos suportar a inteireza de Jesus e aprendemos em fases. Só de pensar o que significa o mistério da Eucaristia a gente sabe do que do que estou falando...
Como o espaço virtual é público e aberto, e sei que meus irmãos de casa e de Comunidade eventualmente lêem o blog, preciso cultivar a discreção porque de nada edifica ficar partilhando as mazelas de cada um e aquilo que nos relacionamentos e na estrutura da vida comunitária é difícil e desafiador. Somos unidos e verdadeiramente irmaõs e irmãs pelo inefável Mistério de Jesus que nos atingiu a todos mas este mistério se mistura com o nosso pó. Somos uma família e família tem amores e dissabores, tem humores e des-humores, tem caras fechadas, temperamentos abertos, experiências de vida diversas muito diversas, sofrimentos curados e não curados, sensibilidades afloradas, tons e semitons.
Comunidade é feita de gente regada a hormônios femininos e masculinos e educações diversas, jeitos e valores diferentes. Divergem os jeitos de limpar, de cozinhar, de cantar, de expressar afeto e raiva, tristeza e amor, gosto artístico. Há idades diferentes, interesses diferentes, times de futebol inimigos mortais. Somos uma família e às vezes me é bem difícil não ter história de vida antiga com essas pessoas com quem convivo e que quase sem querer se tornaram tão importantes para mim. Mas acho que alguns nem fazem idéia disso e a recíproca não é tão verdadeira assim...
Não se ama igual, nem em intensidade nem no jeito de amar. Inclusive há que se aceitar na fase do percurso de deserto atual, quando se processa a purificação para perder os excessos de carga que pesavam na alma e na história, pricipalmente afetiva-relacional, que eu não sou capaz de amar as pessoas sem desagradar, e que eu não sou amada e querida por todas as pessoas! Quando se convive com menos de uma dúzia de pessoas com tal intensidade como é o caso da missão internacional onde a barreira da língua se impõe, a casa comunitária se torna de fato a sua casa, onde tudo acontece, a referência. Acho que fantasiei que eu seria unanimidade, que conseguiria agradar todo o tempo e deixar que vissem pouco as minhas fraquezas. Mas a nudez se faz ver e a gente começa a entender que amar se pode sempre, mas gostar e agradar, não.
A primeira ascese para fazer crescer o amor, este amor que vem de Deus livre, que brota de dentro, como fonte e é dom sobrenatural, é aceitar-me com as vulnerabilidades, carências e dolorosas constatações que não me fazem menos eleita e amada de Jesus, só me fazem mais realista. E a ascese para fazer crescer o amor nos relacionamentos é aceitar que eu posso ser e representar o não-amável para os de casa, identificar quem é o bendito para quem eu sou isso, e não temê-lo nem rejeita-lo, mas optar sincera e corajosamente também por ele, mesmo que se sofra escondido.
Quero lembrar para os que não sabem, que nos Estatutos da Comunidade Shalom está escrito que somos chamados a amar os não amáveis... Facilmente se pensa que os não amáveis são aquelas pessoas singulares que frequentam os grupos de oração, os eventos, as paróquias, os bêbados chatos ou os inadequados comportalmente, as Lauras ou as Roseniras da vida (quem conhece ou conheceu as figuras sabe de quem estou falando), mas não. Quantas vezes eu sou o não-amável para alguém e preciso aceitar esta possibilidade além de reconhecer que a via pode ser de mão dupla: há pessoas que convivem comigo que para mim são não amáveis - não que elas sejam de fato - mas porque amá-las me custa... Isso também é missão, isso também é deixar vencer o Amor no coração e nas mentes, onde as batalhas se travam e deixar transbordar a vitória da caridade, a vitória de quem opta pela construção da paz.
Por fim, ser missionário para mim, é isso: é deserto, é luta, é medo de perder o passado e ser esquecido pelos amigos e pela família, pela distância, é abraçar a família espiritual que se recebe como dom de Deus, é contribuir para que a metamorfose aconteça, ou seja, que os laços humanos que nos unem às pessoas sejam obra do Espírito Santo tecidos a fios de ouro nos corações, e não somente afinidades carnais.
Por isso é que eu não canso de repetir, que vale a pena a missão como leiga consagrada, que é aventura, que estou bem, que faria tudo de novo, que tenho muito a agradecer, que encarnar o carisma Shalom é um dom maravilhoso do Senhor, mas quem disse que não tem noite nem escuridão no deserto?

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Na Abadia de Latroun, perto de Jerusalém

Interior da igreja da Abadia Trapista de Latroun, perto de Jerusalém, conhecida por sua discreção e belíssima escultura de Nossa Senhora por detrás do altar, que está disposta de tal maneira que fica iluminada pela luz do sol enquanto há dia e luz. Ela carrega nos braços o Menino que não está acordado, desperto, de olhos abertos, mas esparramado em seu colo. Causa uma ternura imensa no coração. Acho que bem uma dúzia de mulheres e até alguns homens também, que conheço, ficariam emocionados, começando pela minha mãe e as mães em geral. Pena que não pude passar do limite onde me encontrava, onde se assentam os leigos e visitantes, inclusive para rezar matinas as 4:15 da manhã, para tirar uma foto mais nítida, mas quis muito, cheguei a perguntar se podia me aproximar, mas o monge, de longas barbas com quem cruzei o olhar, fez sinal de não. Fica a intenção!
O que eu fui fazer em Latroun? Fui participar de um retiro sobre o Cântico dos Cânticos - somente a introdução da introdução - com o Father Bonaventure, OCD, que por três meses deu umas aulinhas básicas sobre espiritualidade que foram sensacionais. Quando a gente se depara com um padre espiritual que realmente reza e é filho de Sta.Teresa e de S.João da Cruz, aí é que a chama do amor à oração e do próprio amor são acesas! Comigo puderam participar somente duas outras pessoas de Isifya, o Naim e o Charbel, pai e filho, do rito católico maronita. Charbel tem grande potencial de liderança e segue para o Seminário no começo de setembro. Ele era dado a certos devocionismos exagerados por falta de orientação, mas o Senhor foi em seu auxílio na pessoa do Pe.Bonaventure e agora ele segue mais litúrgico, mais enraizado na Palavra de Deus e no que é verdadeiramente da Tradição e Católico. No retiro houve um 'penetra' que por algumas vezes apareceu nas aulas, o Anise, primo do Charbel, que está em franco processo de conversão. Às vezes eu tinha a impressão que ele estava voando nas explicações e partilhas, mas quando sou tentada a fazer este tipo de julgamento e tenho que me exercitar na paciência e no progredir na caridade, a Palavra de Deus me põe no meu lugar pois ela me recorda que quem semeia a boa semente é o Pai e somente Ele sabe como está o terreno do coração de cada um. Quem disse que eu também não estou voando e distraída diante de tudo o que Deus quer me dar e falar ainda? E Ele é tão misericordioso e paciente... O Anise é o de bermudas. Ao meu lado está o Father Bona, seguido do Naim. O Charbel não quis ir conosco ver os vinhedos e o lugar onde o nacionalmente conhecido vinho dos monges de Latroun é preparado. Demais! O de azul é irmão Antonio, monge mas não sacerdote, um especialista. Por trás de onde estamos pode-se ver os tonéis, lugar da fermentação do vinho, que comportam mais de 60 mil litros cada. É claro que os almoços e jantares foram regados à vinho!


Foto histórica. Foto para lembrar e matar a saudade. Os três alunos com o mestre, sentados nos degraus da igreja tendo Jerusalém a frente para contemplar. Charbel, Naim, Father Bonaventure e eu.

Esta foto foi a despedida, tirada no Muhrakah, aos pés e sob a intercessão do Profeta Elias, onde o Father passou seu ano sabático, vindo de Boston, nos EUA. Father Bona voltou para o carmelo, para casa, na madrugaa do dia 16, para os alunos, postulantes e noviços, deixando muito boas lembranças entre nós na Comunidade e na vila. Encontrei nele um segundo pai espiritual e um grande amigo. A foto ficou ruinzinha mas quis mostrar para os leitores do blog. Graças a Deus os recursos da tecnologia fazem a gente se comunicar com facilidade com quem vai e com quem a gente deixou pra trás.
Esta experiência me faz testemunhar como a Palavra de Deus é certa: quem deixa tudo por amor ao Reino recebe o cêntuplo já neste mundo, e também novos amigos e irmãos e é tão abundante a Providência Divina que a gente nem consegue imaginar ou agradecer o quanto mereceria ser agradecido.

Ah, o amor!

'I love because I love, I love to love' (St.Bernard)
Como se diz em italiano, esta forte frase de S.Bernardo cuja festa celebramos amanhã, dia 20 de agosto, me ha colpito, me atingiu o coração, foi iluminada pelo Espírito Santo e me 'falou' pessoalmente. E ela fala daquilo que é o mais importante da vida, o amor. 'Eu amo porque amo, eu amo para amar' diz o monge que tanto amou e escreveu sobre Nossa Senhora, o caminho mais rápido e seguro para se conhecer Jesus Cristo, seu Filho.
Para mim o que reconheço internamente no meu espírito, no fundo de minh'alma é a presença deste Amor que é o próprio Senhor, a fonte, a torrente sem fim, que lá sempre esteve mas que nesta dança da vida se revela e é encontrado aos poucos. É mistério sorvido paulatinamente, apreciado aos goles, no silencio, na oração, na conquista, na busca sem fim, às vezes na dor, outras não. O amor que atrai e que faz tremer as pernas, que seduz e gera indescritível alegria, a alegria de aprender a amar e de se saber livre para amar. Eu amo porque sou amada e amo porque quero amar em resposta, amando-O em tudo e amando aqueles que Ele ama.
Esta é uma escola por demais exigente mas eu nasci para frequentar cada uma de suas séries e turnos, cercada de pessoas em cada fase e tempo e, quanto mais nela aprendo e me gasto na existência, mais verdadeiramente humana me torno, mais viva estou.
Existe maior alegria na vida do que esta, saber-se pessoalmente querida e cuidada por Deus que é Pai, o Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, que Nele me adotou como filha também? Existe maior ventura do que saber onde se encontra a fonte do amor que é mais forte do que a morte e que ninguém nem nada tem o poder de a extinguir? Talvez haja sim: é a alegria de levar outras pessoas a entrarem nesta mesma Escola, a do Amor, ou seja, a redescobrirem o Corpo de Cristo, místico e concreto, na Igreja, na vida comunitária.
É apontar o caminho da paz e da ressurreição, do coração transpassado e vivo de Jesus, com a alegria juvenil de Teresinha, com compromisso absoluto e radical de João Batista, ou ainda com a intensidade e gratidão de Maria Madalena. É repetir: Ele é o Cordeiro, o Amado, que tira o pecado do Mundo, seu Amor é sem fim e é para todos, para todos, sem exceção. Mais que palavras, sempre fáceis e abundantes, é querer ser, é não desistir de ser, é dar sempre chance a si mesmo e aos outros do Espírito Santo agir, iluminar o caos, pensar as feridas, imprimir a verdadeira vida e sabedoria. Ah! O amor... é amar o Amor mais, sempre mais... Como não ama-lo?

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Breves dos Últimos dias

Celebrei a festa da Assunção de Nossa Senhora no próprio dia 15, sábado, em Haifa, participando da missa na Pastoral Hebraica. No Oriente as festas não são transferidas para o Domingo como acontece no rito Latino e cada religião celebra as festas litúrgicas no dia que cai, mesmo que seja dia de trabalho. Quem pode vai, quem não pode não vai.
Não sei se havia comentado antes, mas desde sempre no Oriente se venerou a Dormição de Nossa Senhora, sendo ela considerada o mais precioso dom humano ofertado e elevado aos céus, como seu Filho Jesus, em corpo e alma, após a morte, prefigurando o que acontecerá conosco um dia, quando também ressuscitaremos. O dogma proclamado em 1950 só fez ratificar o que se crê desde que a Igreja nasceu: que a mais bela das ovelhas do rebanho do Senhor, a bem-aventurada Virgem Maria, já está na eternidade como Jesus, completa e integralmente gloriosa como Ele. Esta festa é tão especial por aqui que por quinze dias se reza e se oferece jejum e pequenas penitências para melhor venerar tão amada Mãe e Senhora no dia 15 de agosto.
Depois da missa com alguns novos amigos de língua polonesa, Pe.Roman, Viktor e Adam, mais Vivi e Cristina, irmãs de casa, aceitamos o convite para um lanche na Ben Gurion, antes de voltarmos para casa em Isifya. Esta é a grande avenida turísitca de Haifa, com os melhores restaurantes, barzinhos, com mesas e cadeiras ao ar livre, no estilo das cidades de beira-mar do mundo inteiro. Foi ótimo. É bom quebrar a rotina e mesmo com simplicidade, por causa da 'dureza financeira' nossa, comunitária, e do bom senso de não abusar dos rapazes, beliscamos uma tábua de queijos e eu provei um chopp forte e bem, bem gelado, que estava no mínimo delicioso! A companhia foi ótima, conversamos sobre nossas respectivas terras e experiências e, na hora do brinde parecia reunião internacional: hebraico, polonês, inglês e português.
Creio que o dom de ter, fazer e manter amigos é algo a se aprender com Jesus, Ele que nos chama de amigos e não de servos e nos revela os segredos de Seu coração. Ele que se reunia com os apóstolos à noite para conversar, para ouvir e para falar. Creio que hoje muitas vezes escutamos Jesus quando escutamos uns aos outros que somos amigos de Jesus e, nessa experiência de comunhão, deixamos ver aquilo que Ele fala às nossas almas e nos ensina através da vida.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

O Lugar do Segredo

How lovely is your dwelling place, Lord,
God of hosts. (Psalm 83-84, 1)

Desde que parti em missão tenho dito e partilhado que esta graça que me foi dada deveria ser desejada e buscada por todos da Comunidade Shalom, tanto os consagrados e que fazem parte da Obra, mas também por todos que são católicos, batizados e que participam deste sacerdócio comum dos leigos. Os religiosos, padres e freiras à moda antiga, diocesanos ou não, deveriam redescobrir esta graça também. Partir em missão para doar a vida em pequenos atos de testemunho e de serviço, e outros quem sabe grandes, na experiência comunitária de convivência e oração. Partir, sair de si, arriscar, com fé e certa dose de aventura, com muito amor e por amor.

De certa maneira não deixa de ser um passo radical tornar-se missionário, pois se interrompe todas as atividades humanas ligadas a um contexto e se inicia um outro, da estaca zero e, me parece, que exatamente ali, na estaca zero que se encontra a mola propulsora de tudo o que vem a seguir. E ela, a mola propulsora, tem um nome que não é a segurança de uma transferência de cargo numa empresa multinacional, ou anos de estudo superior em busca de um doutorado: é o carisma que se tem, no meu caso Shalom, abraçado de uma maneira que nos tira de dentro o que se tem de melhor. De fato estes passos mais radicais em Deus nos levam a perder o que precisa ser perdido para ganhar o que vale a pena: um rosto novo, um nome novo, uma liberdade nova, dado por Jesus. Acho que é o que S.Paulo chama de revestir-se do homem novo. Se eu preciso me vestir é porque uma veste velha foi tirada.
Mas creio - e é o que a Igreja ensina muito especialmente depois do Concílio - que não precisa ser consagrado para tornar-se missionário ou estar pronto para a missão. É mesmo uma atitude de abertura, um desejo, a consciência de que é necessário, como aconteceu com Sta.Teresinha, carmelita enclausurada, padroeira de todos os missionarios. Nunca estamos prontos para a missão. É vivendo-a interna e externamente que vamos sendo colocados pelo avesso e a graça de Deus cresce em nós e se enraiza. Missão não é trampolim de carreira, nem mérito, missão é serviço, é desejo de ser e de dar-se por amor a Jesus Cristo por participar do carisma comum dado a todos no batismo. É esta graça espiritual e sobrenatural em Cristo Jesus, que torna irmãos quem não tem laços de sangue. Belo seria se os laços humanos de sangue que temos fossem também alcançados pelos laços do Espírito Santo fazendo duplamente fraternos...

Vejo que a experiência missionária por sua exigência, revoluciona o exterior e o interior de cada um que se aventura e coloca uma ordem nova nas prioridades da vida, e neste fazer novas todas as coisas, Deus mesmo torna-se concretamente, refúgio, consolo, fonte e sentido, fortaleza e providência, aquele que constrói e que também destrói, principalmente sonhos inócuos e fantasias. Ele carrega pesos e arranca correntes e nos revela nuances e cores da vida jamais imaginados quando vivemos somente no mundinho de origem... Usando a linguagem esponsal tão cara aos que partilham do carisma teresiano da contemplação, como é o caso dos Shalomitas, Jesus torna-se o Esposo, o Amado, a fonte e o fim de cada experiência, desafio, desejo e descoberta. Jesus se manifesta vivo e nos faz verdadeiramente vivos, humanos, encarnados, apaixonados...
Penso que talvez uma das maiores batalhas que travamos interiormente diante do Mal no mundo que se manifesta através das pessoas é continuar acreditando na potencialidade humana de ser bom, de fazer o bem, de ser fraterno, de ser dono de si para poder amar o outro em primeiro lugar. É acreditar mais, muito mais na Encarnação e na Ressurreição do que no horror da Cruz nua e crua vista no sofrimento humano, causado pelo pecado.

Hoje lendo este salmo 83, este versículo especialmente, ao fazer laudes no meu percurso para o trabalho, fui tomada de forte gratidão por perceber que este 'dwelling place', este lugar da habitação de Deus, onde Ele vive e se comunica é o coração do Homem. O meu coração é o primeiro de todos os tabernáculos, o Santo dos Santos, a morada onde Deus descansa, o mais estonteante e belo de todos os sacrários do mundo!

E se não fosse a missão, o desconcertante, inesperado, dialeticamente empobrecedor tempo missionário eu não sei se teria tanta consciência de como a vida poder ser bela e livre, transbordante e feliz como ela é. Eu não teria começado a entender com o coração onde se encontra a esperança a respeito do ser humano, a mesma esperança que o Senhor Jesus tem a respeito de cada pessoa...
O que escrevi mais parece uma colcha de retalhos mas é o perfil do meu retrato atual.


Por isso, quem pensa em ser missionário, voluntário, quem sonha em dar-se por alguma causa em favor de Deus, da Vida, da Verdade, da Igreja, da Ciência, da Arte, do Belo, do Bem da Humanidade, da Paz, seja bem-vindo, arrisque-se, junte-se a nós! Não perca mais tempo! Este é um caminho de felicidade!

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Uma noite inesquecível!

A festa da Transfiguração começou a ser celebrada de véspera, dia 05, como liturgicamente acontece, e após as oração na Catedral fomos diretamente para a Cúria, para nos encontrarmos como Comunidade Shalom com o arcebispo Elias Chacour. Eu trabalho com ele diariamente e, aos poucos, venho construindo um relacionamento de respeito e amizade que inclui a esfera profissional, mas estarmos todos juntos como família, como filhos espirituais, estava sendo programado deste a vinda do Papa em maio, mas nunca dava certo, e nesta noite graças a Deus, aconteceu.

Assim que chegamos nos sentamos ao redor da mesa e conversamos enquanto comíamos figos e uvas verdes, fresquinhas e docinhas, colhidas em Ibillin, o refúgio de D.Elias onde ele viveu por mais de trinta anos como pároco até transferir-se para Haifa como arcebispo da Galiléia. Uma delícia, as frutas, a atmosfera, o tempo passado junto.

Alguns irmãos que estão na diocese há mais tempo como Lorena (7 anos de missão) e Viviane e Tennessee (5 anos) o conheciam ainda como Abuna, antes de tornar-se bispo, e pelos muitos anos vividos na diocese podemos considerar que eles sabem da realidade cultural e humana da Galiléia em seus meandros e nuances. Os demais irmãos sabem menos pois são missionários aqui há menos tempo e falam pouco o árabe ou o hebraico.

Foi uma noite excepcional pela simplicidade e pela comunhão entre nós. Valeu a pena a espera e a carga de intercessão para que este encontro fosse uma verdadeira partilha, marcada pela alegria do Espírito e o desejo de crescer em comunhão, em fidelidade e conhecimento mútuo. Houve também algumas surpresas. Ele nos contou sobre as nada tranquilas reuniões que antecederam a vinda do Santo Padre em busca de verdadeira comunhão entre os vários ritos católicos, e como no fim venceu a vontade soberana de Deus, que é sempre a unidade e o perdão.
Marcou-me o detalhe do arcebispo nos contar de como foi unânime a constatação de que as palavras e discursos de Bento XVI cheias de sabedoria e paz, calaram os adversários, reconfortaram os desanimados e geraram novo ânimo e ardor em todo o rebanho cristão, das ovelhas aos pastores, que formam o povo de Deus em Israel. E mesmo quem a princípio era contra a vinda do Santo Padre por temer que não fosse a hora certa, teve que admitir o contrário.

Vou postar fotos tiradas no fim da noite, onde se constata no rosto a satisfação de cada um. De certa maneira é a transfiguração causada pela vida missionária, pela vida aparentemente perdida e conscientemente doada. Nos disse o Abuna Chacour numa breve homilia espontânea, enquanto assistia conosoco o video caseiro da semana de festas que antecederam o casamento da Sil e do Tenne, que os Padres da Igreja Oriental ensinam que a Festa da Transfiguração fala mais dos apóstolos e de todos nós do que de Jesus. A eles foi dado ver o que os olhos puramente humanos não conseguem perceber: a glória do Filho de Deus. O mesmo o Senhor quer fazer conosco por ação do Seu Espírito: se revelar a nós como Ele é, em todo o seu Amor e Grandeza. A nós cabe desejar, desejar aquilo que Jesus mais do que qualquer outra coisa quer nos dar, que é o conhecimento de Si, a amizade, a salvação, a sua Paz. Dois desejos, um único amor. Só assim dá para entender o desejo de S.Pedro de permanecer no Monte Tabor, tamanho o fulgor, a beleza, a presença do Senhor.
Só que é necessário descer do Monte, o Abuna nos explicou, ao concluir, não é possível alcançar a glória da ressurreição diretamente sem percorrer o caminha humano da existência permeada pela dor e pela cruz. Não se pode fugir da Cruz e ela tornou-se a nossa Tenda, onde encontramos consolo, refúgio e sombra, só lá o Amor é absoluto e sem medidas.

Depois de marcante, voltamos para casa cheios de gratidão pelo bispo que temos, pela experiência singular comunitária de vivermos e por servirmos em comunhão plena com o rito greco-melquita. Enfim, a alegria de sermos Shalom aqui, na Terra Santa.

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

A matemática inesperada

Fiquei encantada com uma meditação lida sobre o Evangelho do dia, da multiplicação dos pães, que me fez desejar mais intensamente a bendita sabedoria de Deus para olhar a vida, toda ela, com o Seu olhar desconcertante.
O autor comentava que o texto falava mais do que aquilo que já sabemos sobre os cinco pães e dois peixes, multiplicados generosamente por Jesus que tinha compaixão do povo e cujo milagre prefigurava a doação de Si mesmo como Eucaristia, milagre esse que por si só já nos deveria inundar de gratidão e alegria, mas o tempo bíblico fala mais. Há um outro milagre que diz respeito ao ambiente onde a multiplicação aconteceu, a circunstância concreta de vida onde acontece mais uma epifania de Jesus, Nosso Senhor.
Quando os discípulos pedem a Jesus que despeça a multidão a tempo dela caminhar até as aldeias próximas para terem tempo de comprar o que comer, eles estão usando toda a lucidez possível para analisar com lógica e com bom senso a situação das pessoas, desejando o melhor para elas. Os apóstolos estão preocupados com a multidão, lotada de crianças, mulheres e seguramente, muitos doentes, sabendo que não teriam condições de atender a todos. Eles estão agindo corretamente. Só que eles caem na maior de todas as tentações que é a mesma nossa, quando usamos somente o bom senso, a análise dos dados e das ferramentas que dispomos: nós tiramos a presença e o poder de Jesus da cena, do problema, da situação. Nós esquecemos dele e de quem Ele é. Nós amortizamos a fé e a confiança e nos sustentamos somente nos parâmetros humanos.
É desnecessário dizer que obviamente é nosso dever de consciência e dever moral usar todos os recursos humanos que temos para enfrentar qualquer realidade humana, só que no gráfico de análise que fizermos temos que incluir os dados da fé que nos remetem à presença Daquele que quebra todos os paradigmas porque tem misericórdia e compaixão de seu povo: Jesus Cristo. Somente Ele.
Fico imaginando se em cada reunião que acontece neste mundo de meu Deus, reunião da bolsa de valores, nos comitês ministeriais, na ONU ou até de condomínio nos prédios que moramos, reuniões de toda ordem onde se tenta resolver tudo e qualquer coisa, e não somente nas reuniões de assuntos religiosos, se nós chamássemos pela presença de Jesus na força do Espírito Santo...
Que diferença se nos exercitássemos na matemática da misericórida e do poder de Deus que não é 2 + 2 = 4 mas 2 + 2 + Jesus = 4 e vida abundante, leite e mel, vinho novo, usando símbolos bíblicos de plenitude. Se nós contássemos mais com Ele, se O deixássemos nos interpelar como Ele fez com o apóstolos, nós veríamos muitos mais milagres, milagres pequenos que dão sabor novo à fé, mas também milagres grandes, do porte de um Festival chamado Halleluya.