quinta-feira, 9 de junho de 2011

A espera de Pentecostes em Jerusalém

Terça-feira, véspera do feriado judeu de pentecostes ou festa da colheita, shavuot (tantas semanas depois da Páscoa) e por não ter ônibus, pude fazer um passeio a Jerusalém pegando carona com o Pe. Roman, responsável para Pastoral Hebraica de Haifa, e um grande amigo. Ele tinha reunião mensal do clero latino com o Patriarca e eu, além de passear, aproveitaria para fazer companhia ao meu outro amigo Hai, vietnamita, a quem vagarosamente vou apresentando a fé católica já que ele é filho de uma sociedade comunista. O Hai se encontraria em Jerusalem com outro vietnamita: o Superior dos Jesuitas, Pe.  Doan. O dia prometia ser cheio, como foi, cheio de surpresas e belezas.

Depois da conversa dos dois na casa dos Jesuítas eu e Hai  fomos bater perna em Jerusalém, na cidade velha, e esta é uma banca de cerejas no meio de mercado árabe. Compramos 1kg e pagamos 0 equivalente a 10 reais. Estavam bem doces e me fizeram lembrar as fotos da minha infância na Itália, com dois anos, sentada sobre cestos de cerejas...

As fotos estão meio fora de ordem e as postei somente como desculpa para dar notícias também visuais e fazer uma pequena partilha de uma dia quente e muito especial. Como não agradecer ao Senhor por poder rezar em Jerusalém pedindo o dom renovado do Espírito Santo sobre o mundo, sobre a Igreja, as nações, a Comunidade Shalom, a missão de Haifa, sobre a família, os amigos, sobre mim e sobre todos aqueles que se confiaram à minha intercessão?

Com o amadurecimento parece que a cada ano esta dependência e necessidade da primazia da Graça do Senhor, ou a ação minuciosa e total do Espírito Santo, só aumenta. Sem mim nada podeis fazer, disse Jesus,  e é mesmo. O Espírito é fonte de toda a vida e é por sua ação que o universo é sustentado não dependendo de se ter fé ou não pois Ele vem antes de todas as coisas. O que é maravilhoso é poder participar, cooperar, oferecer-se livremente como instrumento deste mesmo Amor-do-Pai-e-do-Filho que se derrama sem cessar sobre cada coração e sobre todos os seres viventes. E nós chamados e escolhidos como amigos do Rei somos estas mãos e pés, corações vivos, inteligências claras, vontades alicerçadas na Verdade que apontam o Reino e o Amor da casa do Pai a todos, todo tempo, e para fazer isso só em parceria com o Espírito Santo. Para viver como Jesus só se movidos pelo Espírito de Jesus, no mínimo e no máximo.

Hai Vu e Elena sob o sol intenso de Jerusalém na chamda Porta de Sião (Zion Gate) que dá para os principais lugares santos da cidade.

Na casa dos Jesuítas há um museu com peças arqueológicas trazidas do Egito impressionantes, inclusive uma múmia. O padre francês fundador do Instituto Bíblico dos Jesuítas na década de 2o do século XX, era arqueólogo e egiptólogo daí ter trazido consigo 'quinquilharias' - desculpe o desrespeito - valiosíssimas! Estes são pedaços de argila com anotações - receitas, contas, um exercício de matemática - de mais de 3.000 anos antes de Cristo! Quem é da era do papel e agora do computador consegue dar valor pelo dom de saber escrever e de ter onde escrever com tanta abundância, rapidez e facilidade.
Este é o Pe. Doan, jesuíta, Hai e eu no refeitório logo após o almoço. Foi divertido ouvi-los conversar em Vietnamita e eu fiquei emocionada quando soube um pouco da história deste sacerdote que tem um ar simples e gentil. Ele foi preso político por 9 anos sob o regime comunista por ser considerado perigoso e espião do Vaticano. Era amigo do Cardeal Vang Tuan, aquele outro Vietnamita mais famoso cujo processo de beatificação corre de vento em popa. Pe. Doan viveu 4 anos preso em total reclusão e disse que foi a fase mais dura porque não saía, não lia, não fazia nada. Era um tédio absoluto e enlouquecedor. Depois foram 5 anos de trabalhos forçados na agricultura. Ele esteve com outros presos católicos e nunca ficou em solitária. Comentou que os presos consideram o trabalho no campo quase como uma alforria, um prêmio, pois se sai, se conversa com outros, se ve a luz do sol, se caminha... Ele contou que quando foi interrogado e preso o chefe da Polícia disse que se ele, padre, o quisesse matar seria mais fácil pois o Regime o mataria de volta, mas que esse negócio de querer trabalhar pela paz, pelo diálogo e a reconciliação era muito complicado... que a Igreja estava fazendo as coisas mais difíceis ao que o padre respondeu: não podemos fazer diferente.

Eu fiquei realmente surpresa e emocionada na presença deste sacerdote, pois uma coisa é ler história em livro e outra é ouvir de própria voz e estar diante de alguém santo que já sofreu o martírio físico e psicológico e moral por amor a Jesus, à Revelação de Deus na História, à Igreja, por amor a Deus e a Humanidade. E a simplicidade dele e a não necessidade de se auto-promover e de falar de si me impressionaram pela virtude. O assunto veio a tona porque eu, sem querer, perguntei se o Pe. Doan, teria algum material sobre o cardeal Vang Tuan em Vietnamita para ser emprestado para o Hai pois eu tentei explicar mas sabia pouca coisa, e assim o assunto veio à tona. Ele começou dizendo: tenho sim alguma coisa pois nós éramos amigos e fomos presos no intervalo de uma semana. Ele já era bispo e eu padre e fomos considerados espiões do Vaticano e perigosos para o regime comunista. Estive com o Cardeal Vang Tuan duas semanas antes dele falecer...

A múmia do museu que causou grande surpresa e impressão no Hai que nunca tinha visto uma. Este era um jovem militar de aproximadamente 19 anos.

A tampa da múmia

Talvez, depois da capela, o segundo paraíso: a biblioteca da casa. O Pe. Doan nos disse que a biblioteca é pequena para os padrões jesuítas, aproximadamente 28 mil exemplares. Uma universidade tem por média 300 mil. Cada um destes setores trata especialmente da exegese bíblica: novo e antigo testamento, livros raros, um infinidade... Constato cada vez mais o tamanho da minha ignorância mas sem tristeza. Sempre tive vontade de estudar filosofia e teologia e depois da consagração e da vida de oração através da Lectio Divina esta vontade só fez crescer. Honestamente já havia começado a viver muitos anos antes a Lectio mas sei que ela vem sendo sistematizada, aprofundada e impregnada pela força do carisma. Conhecer para amar mais a Deus e evangelizar e testemunhar com mais unção e precisão. É um conhecimento amoroso o que me interessa e nada mais, mas o Senhor sabe e acima de todas as coisas quero a Vontade dele.


Quatro livros raros sobre o Evangelho de S. João. Fiquei logo pensando nos irmãos e amigos padres, mestres e doutores dentro dessa biblioteca, se deliciando... Pe. João Paulo, Pe. Silvio, Pe. Emílo César...


A foto ficou fora de foco mas esta é a parte externa da biblioteca onde chegam também as doações de livros.

 

O Hai maravilhado por ver e tocar pela primeira vez na vida em uma máquina de datilografar! Que coisa mais engraçada! Ele tem 25 anos e nasceu com o computador...


Um menorah estilizado em homenagem aos seis milhões de judeus mortos no Holocausto (Shoah) que foi dado de presente ao Cardeal Carlo Martini quando depois de se aposentar e se despedir da diocese de Milão, veio morar nesta casa. A peça de arte mostra seis figuras humanas sendo que seis seguram velas e uma a Torah e estão sobre o símbolo de Israel que é a estrela de Davi, rasgada, na imagem pelo sofrimento.


Diante do Muro das Lamentações onde rezei pela PAZ. Sempre rezo pela minha mãe quando venho por aqui pois ela é encantada com essa esplanada. Este espaço me faz pensar e meditar sempre no mistério do terço que fala da apresentação de Jesus no Templo nos braços de seus pais, que se encontram com o profeta Simeão e a profetiza Ana...


De volta ao museu: um pedaço de pedra com o Alfabeto Aramaico inscrito. Essa era a língua que Jesus falava. Talvez fosse uma aula preparada por algum professor para seus alunos de alfabetização... Brincadeira.

A banca abarrotadas de cerejas no mercado árabe, no quarteirão árabe muçulmano, da cidade velha de Jerusalém. Dá para observar o tipo humano dos comerciantes. O de trás vende pão pita.

Deixei por último esta imagem que me impressionou muito: este é um galho da planta que se atada nas duas pontas vira uma coroa, uma coroa de espinhos. Foram espinhos como estes, enormes como palitos e duríssimos, que foram enfiados sem dó nem piedade na cabeça de Jesus. Esta planta é da região sul do país onde está Jerusalém e quando vi uma religiosa com este galho na mão para mostrar a seus alunos na aula de catequese, quis fazer o mesmo, mostrando-o a todos que porventura acessarem o blog. Assim Jesus foi torturado por Amor de nós. Assim Ele venceu a morte passando por ela e nos deu direito à vida eterna. Agora estando à direita do Pai onde nos espera e onde por direito podemos ir, Ele novamente nos dá o Seu Espírito para que vivamos bem, vivamos como filhos amados.

Feliz Pentecostes! Vem Senhor! Manda o teu Espírito sobre a face da terra e sobre a face de cada coração. Amém! Shalom!

3 comentários:

Anônimo disse...

Que maravilha!! Poder participar um pouco da rotina de vcs. em Jerusalém. Fiquei mto. feliz. Mto. obrigada e mande um abraço para nossos irmãos vietnamitas.
Fátima - Belém

Rafael D'Aqui disse...

Querida Elena,
Lendo seu post me dei conta que conhecemos bem o Pe. Doan. Ele já celebrou várias vezes para nós no Centro S. Lorenzo lá em Roma que fica ao lado da Casa Geral dos Jesuítas... Que feliz coincidência. Homem de Deus! Que testemunho!
Shalom!
Um abraço fraterno,
Rafael

Gleiber Dantas de Melo, padre disse...

Elena, muito prazer. É a primeira vez que nós nos comunicamos. Meu nome é GLEIBER DANTAS DE MELO. Tenho 33 anos, sou padre da Diocese de Caicó (RN), embora trabalhando na Arquidiocese de Olinda e Recife (PE), há um ano. Fazendo uma busca por "ELIA VOLPI" na rede, encontrei seu blog. Estudei no Seminário São José do Rio de Janeiro entre 1996 e 2001. Fui aluno, em 1996, de sua mãe, D. Maria da Glória Ávila Arreguy Sala; ela nos deu umas aulas de bom comportamento! Fui aluno de Mons. Elia Volpi e do meu querido, amado, idolatrado, salve, salve Pe. Luiz Fernando. Conheci Ir. Trindade, Ir. Zezé e Ir. Guida (risos). Deixo-lhe um grande abraço, em Cristo. g.dantas@yahoo.com.br